Eu, Nina, baptizada com o nome de Maria do Carmo, e com a idade de 59 anos, vou tentar contar a história de meus pais.
Desde muito pequena, em Silva Porto, minha terra, capital do Distrito do Bié, Angola, fui registando na minha mente (pois sempre adorei ouvir histórias), o que minha mãe me contava quando andava atrás dela, umas vezes na horta a semear, outras vezes a fazer bolos, broa, pão doce, que depois mandava vender.
Assim, ela ensinou-me a amar e a guardar com carinho no meu coração, toda a família que não conheci.
Meu querido pai Manuel Gomes Leal, nascido em Barrancos, Distrito de Beja, Alentejo, no dia 3 de Abril do ano de 1897,era filho de Manuel Garcia Leal, natural de Barrancos e de Fructuosa Gomes Pica Leal, natural de Amarleja, Distrito de Beja, Alentejo.
Meu avô, agricultor em Barrancos era dono de uma quinta com lagar, alguns cavalos e terrenos com grande extensão de olivais. Moravam como contava meu pai, numa linda casa com uma escadaria de pedra, toda cheia de trepadeiras floridas. Tinham mais uma filha, 3 anos mais nova que meu pai, chamada Constança.
Meu pai, aos 20 anos de idade, com o espírito cheio de aventuras, foi para Angola, mais propriamente para Benguela, onde se estabeleceu como comerciante no ano de 1917.
Minha querida mãe Beatriz do Nascimento Soares de Brito, nasceu na Ilha da Boavista, Cabo-Verde, no dia 25 de Dezembro do ano de 1898 e era filha de José Soares de Brito, advogado, natural de São Vicente e de Maria da Luz Zaudai, natural de Santo Antão, Cabo-Verde, filha de Marcos de Cima Zaudai, natural de Marrocos.
Minha mãe, contava-me que este seu avô, era judeu. Meu avô, pai de minha mãe, jovem e muito leviano, conheceu em Santo Antão, minha avó, Maria da Luz, muito jovem ainda e ela foi levada por promessas pelo meu avô, pai de minha mãe, e ficou grávida, vindo a nascer minha mãe, a quem deram o nome de Beatriz.
Tempos depois, meu avô tirou-lhe a menina, levou-a para São Vicente, entregando-a aos cuidados das suas tias, Guiomar, Cândinha e Emília ou Elisa, não me lembro bem. Estas tias, criaram-na com muito carinho, mas também com muita disciplina. Minha mãe contava-me que pouco se lembrava de sua mãe, que ia vê-la de vez em quando. A imagem que guardava dela é que era uma senhora de cabelos meio lisos e levemente alourados.
Lembrava-se de um dia a mãe ir despedir-se dela a chorar. Abraçou-a muito, dizendo que ia embarcar para a América. Minha mãe era muito pequena e nunca mais a tornou a ver, nem ouviu falar dela. Portanto, minha avó Maria da Luz, certamente formou por lá família, e quem sabe se temos tios e primos americanos...
As tias de minha mãe, que a criaram, eram senhoras de boa posição, pois a família Soares de Brito, era muito respeitada e estimada em Cabo-Verde.
Na cultura cabo-verdiana, as pessoas são designadas por gente de pele clara ou escura. Quando se referem a um sujeito preto, apenas dizem: "aquele fulano escurinho". Meu avô e família, eram de pele clara.
Eu e os meus irmãos, apenas temos sangue português, caboverdiano e marroquino. Somos angolanos, apenas por nascimento.
Portugal, também é um País com muita mistura de raças, no princípio, os fenícios, cartagineses, romanos, gregos, espanhóis, mouros, etc..
Há uns anos atrás, eu e o meu marido, vimos um programa de televisão, no segundo canal, em que foi dito que quando se deu a abolição da escravatura, uma boa parte dos escravos negros, que se encontravam em Portugal, espalharam-se pelo País, mas grande parte deles pelo Alentejo, mais propriamente na zona de Alcácer do Sal, Baixo Alentejo e Algarve. Chegaram mesmo a entrevistar varias famílias alentejanas, descendentes desses escravos. Tenho visto vários portugueses com cabelos muito frisados, e quem sabe se serão descendentes desses escravos.